Não que eu seja o tipo de pessoa que prefere corridas entre semáforos a assapar por ruelas em paralelo, mas há qualquer coisa em ter riscas de corrida ou o capôt preto e fazer burnouts perfeitos alimentados por um motor generoso e um line lock para travar só as rodas da frente, que me faz sonhar acordado um pouco.
Isso leva-me ao carro de hoje, o Ford Torino Cobra de 1970 e 1971.
Optei por falar deste modelo específico, apenas destes dois anos de produção por algumas razões. Em primeiro lugar, a geração anterior é famosa pela sua invejável série de vitórias na NASCAR, com o Torino Talladega, depois, o modelo de 1972 teve direito a um filme inteiro com o seu nome, Gran Torino, realizado e protagonizado por Clint Eastwood, assim como o papel do carro vilão no quarto filme da série Velocidade Furiosa e, por último, o modelo de 1974 é o eterno carro de Starsky and Hutch. Isto deixa a geração de '70 a '71 quase esquecida e mais dificilmente exposta ao mundo para lá da América do Norte, que, logo por azar, inclui Portugal.
Para ajudar a localizar o Torino na parafernália de modelos da Ford nos Estados Unidos, ele era mais ou menos o equivalente a um Cortina MK3, ou Taunus TC, com versões de 4 portas e até carrinha, mas incluindo um descapotável. O Cobra estava limitado à versão fastback, ou Sportsroof. Era uma espécie de irmão mais velho do Mustang, como o Chevelle para o Camaro.
Mas, para além do tejadilho desportivo, o que tornava o Torino Cobra num carro especial, era, sem dúvida, o motor. Quando há pouco falei em motores generosos, escolhi cuidadosamente essas palavras para incluir tudo o que já foi colocado debaixo do capôt de um Muscle Car, desde 4 cilindros e V6 sobrealimentados aos Big Block V8's. O Torino Cobra era equipado com um dos últimos: 7 litros de metal bruto de Detroit, ou de Lima, no Ohio, que era onde o motor era fabricado, mas deu para perceber a ideia. São 7033 centímetros cúbicos, imaginem "7.0" na mala do vosso carro, sete vezes a cilindrada de um Ecoboost 3 Cilindros. Isto traduzia-se para 370 cavalos, todos a correr assustados pela mesma Cobra.
A caixa de velocidades era manual de 4 velocidades, com a opção da automática de 3, que permitiam levar a besta de cerca de 1700 kg até aos 217 km/h, fazendo 0-100 em menos de 6 segundos na versão manual.
A suspensão do Cobra era melhorada, os pneus traziam letras brancas de série, o capôt era pintado de preto baço (em 71 passaram a ser duas riscas) e tinha um buraco no meio para dar lugar a uma entrada de ar presa ao motor, que também era pintada de preto baço, criando desta forma o efeito de que o capôt abanava com o trabalhar do carro. A paleta de pintura era repleta de cores vivas, como o Grabber Blue, mas outras mais discretas como o Dark Ivy Green ou o próprio Raven Black.
Não é o tipo de carro que provavelmente vamos conduzir, nem tão pouco o carro que ambicionamos ter quando "formos grandes", mas se nos presentearem com uma quantidade avultada de dinheiro e decidirmos comprar um destes em vez de um Porsche 911, um Mercedes S500 ou um Ferrari Italia, vamos ser quem mais cabeças vira, e iremos cimentar a nossa reputação de connoisseur, assim como de viciado.
Gonçalo Sampaio, no Vício dos Carros
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